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LEMBRAR FLORBELA ESPANCA
Muito se tem escrito sobre Florbela Espanca. Da singularidade da sua obra poética. Do seu carácter, da sua inquietude, da sua melancolia. Não venho, por isso, acrescentar nada. O que aqui trago é um olhar sobre um pormenor da sua vida. Na Primavera/ Verão de 1918, Florbela veio para o Algarve tratar-se do grave problema de saúde que a apoquentava. “Veio atraída pelo clima ameno, dos ares puros e grande salubridade da orla marítima”. Instalou-se em Quelfes, pequena freguesia do concelho de Olhão, na casa da cunhada Doroteia, professora primária na escola da aldeia.
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Mas “Florbela amava a cidade, o movimento, o reboliço, a sua roda de amigos (…)”, “era uma mulher de excepção, estranha à sociedade envolvente e com sérias dificuldades de adaptação a regras de conduta social, que se antepunham à sua intrínseca necessidade de libertação”. Assim, a sua passagem por Quelfes não se traduziu, de modo algum, em felicidade. “A solidão exasperante da aldeia atormentava o seu espírito sequioso de comunicação, carinho, afecto admiração… de fama , com a qual sempre sonhou, mas que só veio a obter depois da morte”.“Foram seis meses de forçado sossego, algum marasmo e uma imensa solidão literária. Quase um degredo, com que se não compadecia o seu natural estado de espírito.”
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Altiva e couraçada de desdém
Vivo sozinha em meu castelo, a Dor…
Debruço-me às ameias ao sol-pôr
E ponho-me a cismar não sei em quem!
.Castelã da Tristeza, vês alguém?!...
-E o meu olhar é interrogador…
E rio e choro! É sempre o mesmo horror
E nunca, nunca vi passar ninguém!
.-Castelã da Tristeza, porque choras,
Lendo toda de branco um livro d’horas
À sombra rendilhada dos vitrais?...
.Castelã da Tristeza, é bem verdade,
Que a tragédia infinita é a Saudade!
Que a tragédia infinita é Nunca Mais!!!
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No entanto, Florbela gostava do casario branco de Olhão, onde às vezes vinha, e de ver o pôr do sol na Ria Formosa.“Existem sonetos que recordam esses momentos inesquecíveis, marchetados pela inebriante beleza de um sol refulgente, que empresta a este céu aquele azul extasiante que só os poetas sabem cantar. Escreveu-os em Quelfes, inspirada na tristeza da sua solidão acompanhada”.
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É triste, diz a gente, a vastidão
Do Mar imenso! E aquela voz fatal
Com que ele fala, agita o nosso mal!...
E a Noite é triste, como a Extrema-Unção.
.É triste e dilacera o coração
Um poente do nosso Portugal!
E não vêem que eu sou…eu…afinal,
A coisa mais magoada das que o são!
.Poentes d’agonia tenho-os eu
Dentro de mim, e tudo quanto é meu
É um triste poente d’amargura!
.E a vastidão do Mar, toda essa água
Trago-a dentro de mim num mar de Mágoa!
E a Noite sou eu própria, a Noite escura!
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No dia 8 de Dezembro de 1930, Forbela Espanca libertou as amarras que a prendiam à desilusão na procura da felicidade, ao conflito interior. Completava nesse dia 36 anos, e, nas suas palavras, "Tudo será melhor do que esta vida!".
Fonte: "Florbela Espanca na Vila de Olhão", José Carlos Vilhena Mesquita, 1996
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Fonte: "Florbela Espanca na Vila de Olhão", José Carlos Vilhena Mesquita, 1996
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Este post faz parte da Blogagem Coletiva Interlúdio com Florbela, promovida pelo Blog Interlúdio.
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