quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Helô do Blog Sintonias do Coração



Blogagem Coletiva "Interlúdio com Florbela"
Homenagem ao nascimento de Florbela em 8 de dezembro










Florbela de Alma Conceição Espanca, uma sagitariana típica, nasceu em Vila Viçosa em 08 de dezembro de 1894.
Viveu a fundo os mais diversos estados da alma - depressão, exaltação, concentração, dispersão - que na sua poesia atingem tão vibrante expressividade.
Traz em sua poesia uma intensa carga de sentimentos e questionamentos existenciais e com muita naturalidade trata de temas como paixão, morte, desencanto e de outras agruras da vida de maneira contundente e sem pieguice. Ela traz também em seus textos, apesar do que foi dito anteriormente, uma imensa ternura e um desejo de felicidade e plenitude. A veemência passional de sua linguagem, com marcas bem peculiares e o foco para suas próprias frustrações e aspirações, apresenta um sensualismo muitas vezes erótico. Ao mesmo tempo, a paisagem alentejana está presente em muitas de suas imagens e poemas, e, por essa razão, seus escritos estendem sua comoção interior de poeta para a natureza.
Florbela Espanca não se ligou claramente a qualquer escola literária. Esteve muito mais próxima do neo-romantismo e de certos poetas do final do século XIX do que dos modernistas, a quem ignorou. A técnica do soneto que a celebrizou leva a crer que sua poesia sofreu forte influência de Antero de Quental e, mais longinquamente, de Camões.
Ignorada pela preconceituosa crítica do início do século, é considerada hoje em dia a mais sublime voz feminina da poesia portuguesa de todos os tempos.
Dividiu a sua curta, mas admirável obra, entre poesia e prosa, completando uma produção escrita de extraordinária beleza, que evidencia a sua singularidade, como poetisa e como pessoa.

Mulher de temperamento único e escritora de sensibilidade muito rara, criou um universo temático próprio, alvo de críticas, e uma estética independente face a outros escritores e poetas. Contudo, é visível o cruzamento de diversas influências literárias, bem como uma grande capacidade de sintetizar o sentir dos poetas, como nos mostra em «Ser Poeta»
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Ser poeta é ser mais alto, é ser maior
Do que os homens! Morder como quem beija!
É ser mendigo e dar como quem seja
Rei do Reino de Aquém e de Além Dor!
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É ter de mil desejos o esplendor
E não saber sequer que se deseja!
É ter cá dentro um astro que flameja,
É ter garras e asas de condor!
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É ter fome, é ter sede de Infinito!
Por elmo, as manhãs de oiro e cetim…
É condensar o mundo num só grito!
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E é amar-te, assim, perdidamente…
É seres alma e sangue e vida em mim
E dizê-lo cantando a toda a gente!
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Florbela Espanca,
«Ser Poeta», in «Charneca em Flor»
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Seus sonetos são um ousado diário íntimo, onde palpitam as ânsias de uma mulher ardente, a clamar pelas carícias de um amor impossível. O caudal dessa insatisfação veio desembocar na trágica madrugada de seu 36o aniversário, 07 de dezembro de 1930, quando a bela e carnal alentejana se calou para sempre, após uma dose excessiva de Veronal.
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OS TEMAS
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1. A dor e a ansiedade
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Florbela Espanca parece-se muito com Antero. Ambos procuraram no mundo a felicidade com que sonharam, e em vão. Todavia , a dor de Antero é metafísica, é uma dor que se preocupa com problemas transcendentes: a razão das coisas, o destino das coisas, o futuro de tudo, sobretudo o futuro. Florbela preocupa-se mais com o presente, com o que é terreno e lhe pode causar gozo e dar alegria, com o amor sensível, principalmente com o amor. Quer dizer: a Antero doeu-lhe a inteligência; a Florbela, o coração.
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a) Um temperamento vulcânico
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Nas poesias de Florbela encontra-se uma intensa vibração erótica feminina. É uma egotista sui generis, que não oculta flagrantes indícios de narcisismo. Às vezes, grita, pletórica de histerismo:
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Eu quero amar, amar perdidamente!
Amar só por amar! Aqui... Além...
Mais este e aquele e outro e toda a gente...
Amar! Amar! E não amar ninguém.
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Outras vezes — quem o havia de dizer? — este tumultuar de paixões acalma e ela desejaria encontrar o seu paraíso perdido e queria então:
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ser a moça mais linda do povoado;
pisar sempre contente o mesmo trilho;
ver descer sobre o ninho aconchegado
a benção do Senhor em cada filho;
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ser pura como a água da cisterna;
ter confiança numa vida eterna,
quando descer à terra da verdade.
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b) A solidão
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A poetisa queixa-se a miúdo de estar só. Não foi de fato compreendida. Convenceu-se de que o mundo teria de ser à sua volta um arraial festivo, quando ele não passa afinal de um vale de lágrimas. Quis que os outros se sujeitassem aos seus caprichos e volubilidades, mas ninguém lhe podia aturar os nervos e a altivez. Isolou-se então cada vez mais:
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Altiva e couraçada de desdém,
vivo sozinha em meu castelo: a dor!
Passa por ele a luz de todo o amor...
E nunca em meu castelo entrou alguém!
...........
Neste triste convento aonde eu moro,
noites e dias rezo e grito e choro,
e ninguém ouve... ninguém vê ...ninguém!
Mas esta solidão resulta de se não sentir amada:
Vejo-me triste, abandonada e só
bem como um cão sem dono e que o procura,
mais pobre e desprezada do que Jó
a caminhar na via da amargura!
Judeu errante que a ninguém faz dó!
Minh'alma triste, dolorida e escura,
minh'alma sem amor é cinza e pó,
vaga roubada ao Mar da Desventura!
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c) O desespero
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Não tardou muito que Florbela, cada vez mais só, se desse conta de que procurava inutilmente a felicidade na terra. Um após outro, todos os sonhos se lhe desfaziam nas mãos como bolas de sabão. E cansou-se de esperar por melhores dias:
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Maria das Quimeras, que fim deste
às flores de oiro e azul que a sol bordaste,
aos sonhos tresloucados que fizeste?
Pelo mundo, na vida, o que é que esperas?
...Aonde estão os beijos que sonhaste,
Maria das Quimeras, sem quimeras?
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d) O regresso ao nada.
A solidão, o desespero, o desengano levaram-na ao desejo da morte:
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Morte, minha senhora Dona Morte,
...........
fecha-me os olhos que já viram tudo!
Prende-me as asas que voaram tanto!
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A morte não lhe seria tão dura, se, para além dela, visse Deus. Acreditaria em Deus? Fala nEle a cada passo. Chega mesmo a formular algumas preces:
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Meu Deus, dai-me esta calma, esta pobreza...
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Diz até que o procurou:
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Quem me dirá, se lá no alto, o céu
também é para o mau, para o perjuro?
Para onde vai a alma que morreu?...
Queria encontrar Deus! Tanto o procuro!
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2. O seu Alentejo



Poucos escritores souberam retratar tão fielmente como Florbela Espanca a alma da planície alentejana. É que a planície, com a infinidade de seres que nela se movimentam, incarnou na sua personalidade. Começou por senti-la:
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Fumo beijando o colmo dos casais...
Serenidade idílica das fontes
e a voz dos rouxinóis nos salgueirais...
Tranquilidade... calma... anoitecer...
Num êxtase eu escuto pelos montes
o coração das pedras a bater...
Passou depois a comparar-se com as árvores:
A planície é um brasido... e, torturadas,
as árvores sangrentas, revoltadas,
gritam a Deus a bênção duma fonte!
Arvores, não choreis! Olhai e vede:
— Também ando a gritar, morta de sede,
pedindo a Deus a minha gota de água!
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Viu ainda que as pessoas, os animais e as coisas se interpenetram em metempsicose e panteísmo:
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Toda esta noite o rouxinol chorou,
gemeu, rezou, gritou perdidamente!
Alma do rouxinol, alma de gente,
tu és talvez alguém que se finou...
.............
Toda a noite choraste... e eu chorei
talvez porque, ao ouvir-te, adivinhei
que ninguém é mais triste do que nós!
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Finalmente a poetisa quase se confunde com a terra, com as ervas, com as árvores, num panteísmo pampsiquista onde há vestígios nítidos de Eça e Antero:
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Vejo-me asa no ar, erva no chão,
oiço-me gota de água a rir na fonte...
..............
E de bruços na terra penso e cismo
que, neste meu ardente panteísmo,
nos meus sentidos postos e absortos
nas coisas luminosas deste mundo,
a minha alma é o túmulo profundo
onde dormem, sorrindo, os deuses mortos.
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"Sou pagã e anarquista, como não poderia deixar de ser uma pantera que se preza..."
(de uma carta a Guido Battelli)
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Inconstância
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Procurei o amor, que me mentiu.
Pedi à vida mais do que ela dava;
Eterna sonhadora edificava
Meu castelo de luz que me caiu!
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Tanto clarão nas trevas refulgiu,
E tanto beijo a boca me queimava!
E era o sol que os longes deslumbrava
Igual a tanto sol que me fugiu!
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Passei a vida a amar e a esquecer…
Atrás do sol dum dia outro a aquecer
As brumas dos atalhos por onde ando…
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E este amor que assim me vai fugindo
É igual a outro amor que vai surgindo,
Que há-de partir também… nem eu sei quando…
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Florbela Espanca - Livro de Soror Saudade

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Curiosidade:





Clique abaixo
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Fonte:Pesquisa Internet
Barreiros, António, "História da Literatura Portuguesa-2", 1983, Editora Pax, Braga.
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Este post faz parte da Blogagem Coletiva "Interlúdio com Florbela",

promovido pelo Blog Interlúdio.

3 comentários:

ETERNA APAIXONADA disse...

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Querida Flor ♥

Meu obrigada pela iniciativa outra vez!

Um enorme sucesso essa Blogagem Coletiva, homenageando Florbela e os blogueiros participantes.

Parabéns pelo seu belíssimo trabalho, esforço, dedicação, entusiasmo, dignos de uma alma poética pura!

Minha amizade e admiração eternas!

Grande abraço e um beijo em seu coração,

Helô

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Gaspar de Jesus disse...

FLOR
Que maravilha esta sua postagem.
Gosto tanto qye já não encontro palavras para o dizer sem ter de me repetir.
MA-RA-VI-LHO-SAS Quer a sua iniciativa quer tudo o que de bom e inédito para mim aqui colocou em homenagem a FLORBELA ESPANCA.
Sinceros parabéns
G.J.

Cleo disse...

Flor, está magnífica esta postagem da Helô. E também repetindo os comentários anteriores te parabenizo pela iniciativa tão linda. Um show.
Beijos, bela quarta.
Cleo